17 de mar. de 2009

previsível

Li uma vez que a perfeição é a conseqüência natural da eternidade; com o tempo necessário, qualquer coisa realiza seu potencial: o carvão se transforma em diamante, a areia em pérolas e os macacos em homens.

A máxima "ninguém é perfeito" deve ter surgido daí. Simplesmente porque o nosso tempo aqui é curto, insuficiente para contemplar tais transformações ou atingir um estágio superior ao de criaturas "racionais mas autodestrutivas".

Li também que o amor é um tipo especial do que seria uma "derrota por não ser eterno". Ele seria a lembrança da certeza de que alguma consumação, por mais desejada que seja, nunca se realizará; de que alguns macacos nunca se transformarão em homens. Porque não há tempo.

Mas este, dizem, é relativo. E não me faltam provas de que, em muito menos do que o necessário para as transformações supracitadas, pode-se conhecer a perfeição. Não a perfeição estética. Ou o ápice de o que quer que seja. Mas a perfeição como simplicidade, como acontecimento comum mas eterno em seu momento

Durante minha formatura, ouvi dizerem que surpreendemos no previsível. O previsível era o discurso dos oradores, o vídeo de fotos, a nossa entrada ao som de Praieiro. Ora, o previsível - ou a surpresa - foi a perfeição aquela noite. Cada um desses momentos - a entrada, a hora em que a música que eu escolhi tocou, a homenagem que recebi dos meus colegas - se tornou eterno e, conseqüentemente, perfeito.

Quando eu tinha 14 anos e achava que já era gente, em uma tarde de sol do nosso inverno serrano, meu namorado - meu primeiro namorado - pôs uma azaléia roxa no meu cabelo. Foram poucos segundos, mas eles se eternizaram, formaram um momento perfeito.

Tem imagens, histórias, coisas, que são assim: aperfeiçoam-se. Sozinhas. E, às vezes, pelo simples fato de terem existido. Normalmente, são essas as lembranças que ficam. Felizmente, nem tudo 'dura tempo o bastante para se tornar inesquecível' - a graça da memória está, justamente, na seleção das lembranças, em manter, entre outras coisas, o especial. E a minha formatura e a azaléia, como tantos outros acontecimentos (bem, talvez nem tantos), permanecerão, sobreviverão, junto com as pessoas que fizeram parte deles. Porque a perfeição pode, sim, ser conseqüência da eternidade, mas é, também, um privilégio da simplicidade.

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